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Barcelona, dez anos e duas conexões depois

O Mobile World Congress, maior evento móvel do mundo, entra na revolução 4.0 com uma série de questões com as quais a humanidade começa a lidar e conviver rotineiramente

Sergio Damasceno Silva
24 de fevereiro de 2017 - 11h19

A Igreja da Sagrada Família, de Gaudí, é um dos maiores ícones de Barcelona

Em fevereiro de 2007, visitei Barcelona pela primeira vez. O impacto medieval é imenso sobre um cidadão, como eu, chegado do Novo Mundo. Quer dizer, novíssimo! Porque a história de Barcelona data de quatro mil anos, antes mesmo da era cristã. Além da obviedade dos ícones mundialmente reconhecidos como a Igreja da Sagrada Família do arquiteto Gaudí; das ramblas, ruas adjacentes à avenida La Rambla, uma das mais largas e extensas da cidade; e o bairro Gótico, núcleo fundado pelos romanos e que tem mais de dois mil anos de existência, Barcelona tem um apelo emocional: é a capital da Cataluña, região que é berço da minha bisavó materna, a avó Caetana.

Não conheci a antepassada e dela só tenho referências da minha mãe, que conviveu um curto período de tempo com ela na infância. A bisavó Caetana deve ter chegado ao País em algum momento entre o final do século XIX e o início do século XX porque, apenas entre 1882 e 1930, chegaram ao Brasil mais de 550 mil espanhóis. O que sei dela é que recusou-se até à morte a falar português, usava vestidos compridos escuros que cobriam do pescoço aos pés e era temida por parentes e estranhos. Nem consigo imaginar que descendo de tal personagem. Só imagino que ela era uma forasteira em terra estrangeira que desconfiava daqueles “selvagens” (minha cidade foi fundada por mineiros que desbravaram o sertão paulista) que a rodeavam. E que deveria recordar-se daquela longínqua Cataluña, que faz fronteira com Andorra, França e o mar Mediterrâneo, tem um relevo irregular como os Pirineus e o sistema mediterrâneo catalão, que são uma série de cordilheiras, e cujo clima vai de ameno à neve abundante. Não sei qual era a atividade da bisavó Caetana na Cataluña. Muito provavelmente, como mais de 80% das pessoas à época, trabalhava na terra. Ou seja, nas vinhas, nos olivais ou em alguma outra plantação de subsistência.

Esse laço secular com a Cataluña, portanto, foi algo que mexeu comigo quando lá cheguei. Imaginei se a bisavó havia passado pelas ramblas em algum momento, se havia pegado alguma estrada que percorri (fiquei hospedado num hotel em Tarragona, que tem monumentos romanos e que fica a 100 quilômetros de Barcelona) ou caminhado à beira do Mediterrâneo, tal qual fiz na Barceloneta. Quando visitei a Sagrada Família, cuja construção começou em 1882 e ainda não terminou, e subi uma das torres, a mais de 100 metros de altura, tive certeza absoluta que a bisavó havia, pelo menos, passado por ali. Oras, minha bisavó era católica. A Espanha é predominantemente católica. Logo, minha bisavó haveria de ter visitado a não menos católica Sagrada Família.

Conexão emocional e móvel

Em 2007, a Netflix começava a migrar do modelo de entrega de DVDs pelo correio para chegar ao streaming de vídeo que o mundo todo conhece

Essa foi a conexão emocional. Mas, em 2007, já havia outra conexão em curso, a móvel. Era fevereiro de 2007 e o mundo não conhecia o iPhone, que chegou ao mercado em junho daquele ano. Em São Paulo, a TV digital estrearia no final do mesmo ano. Alguns mamutes digitais atuais como Facebook, YouTube e Twitter eram bebês: haviam sido criados em 2004, 2005 e 2006, respectivamente. Em 2007, a febre do momento era o Second Life, que estourou como tantas outras bolhas da web. Ainda em 2007, a Netflix, fundada em 1997, começava a operação de streaming em substituição à entrega de DVDs pelo correio. Esse era o cenário digital.
No evento naquele ano, a preocupação era com os lançamentos. Havia a Nokia, líder inconteste dos celulares, a Motorola, forte, e algumas que arriscavam-se no cada vez mais rentável mercado de aparelhos como as coreanas Samsung e LG. Centenas de operadoras previam futuros para todos os gostos. Era 2007 e havia dois bilhões de usuários de telefonia móvel. Hoje, o mundo tem quase 4,8 bilhões de assinantes móveis. As marcas revezaram-se. A Nokia foi vendida e tenta voltar. A Motorola foi vendida e virou Moto. A Samsung assumiu a liderança e a Apple, com o iPhone, teve um longo reinado. Há dez anos, o mundo era fixo, enredado pelos fios das antigas empresas de telefonia. Agora, o mundo é móvel e paira nas nuvens, literalmente, no cloud computing, e as operadoras são multiplataformas e oferecem voz, dados, TV, telefonia fixa (por enquanto) e móvel. O mundo inteiro viu acontecer a consolidação do setor.

A revolução 4.0

Entre 2007 e 2017, a chamada quarta revolução industrial (ou 4.0), que representa a transição da humanidade entre a infraestrutura da revolução digital (redes móveis, internet, conectividade) e o que será construído sobre isso (computação nas nuvens, biociência, biotecnologia, nanotecnologia, cyberfísica etc.) avançou rapidamente para chegar à atualidade com os temas que Barcelona debate agora: internet das coisas, inteligência artificial, realidade virtual e aumentada, robótica, uso intensivo de algoritmos e computação cognitiva. Em uma década, o salto foi gigantesco: a Revolução Industrial (de 1760 a 1830) levou décadas. A segunda aconteceu por volta de 1850, com a eletricidade e a produção em massa por conta disso. A terceira começou em meados do século 20 com a eletrônica, TI e telecomunicações. E a quarta é atual, em que as pessoas convivem efetivamente com máquinas (machine to machine, machine to consumer) e começam a interagir de forma mais orgânica com a carros conectados ou autônomos, geladeiras e fogões que “conversam” e dão informações por apps, bots que reorientam o marketing, ferramentas de IA preditivas e cognitivas que aperfeiçoam respostas e reagem e, finalmente, robôs que saem da esfera industrial para popularizar-se como alternativa a alguns serviços até então essencialmente domésticos.

A internet das coisas (IoT) é, entre outros temas, um assunto que deve dominar o MWC e que envolve toda a rede móvel e a infraestrutura 5G das teles, futuramente

O que esperar, portanto, dez anos depois de ter visitado o MWC? De evento que recebe mais de cem mil pessoas de mais de 200 países espera-se muito. Sobretudo insights do que desenvolvedores, CEOs, operadoras e fabricantes podem gerar sobre toda a tecnologia mobile envolve. Sobre as aplicações práticas que se converterão em novos Uber, Netflix e Airbnb. Sobre a transformação de processos em algoritmos capazes de processar vontades e desejos na forma de dados. Sobre uma conectividade jamais vista e que não tem volta. Que ligará todas as coisas e todos os seres. Barcelona, berço da minha ascendência materna, terra da avó Caetana, significa, para mim, portanto, a união entre a conexão arcaica e a novíssima conectividade. Uma, ligada ao fio terra da origem. Outra, desligada, já que sem fio, e pendurada nas nuvens. Ambas relacionadas à roda da evolução que não para nem por um momento de girar.

 

 

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